quinta-feira, 14 de maio de 2009

APLAUSOS! (A)O NOVO PARADIGMA




Foi com imensa satisfação e orgulho que li/vi as notícias relativas à reacção de José António Pinto, Ministro da Cultura, face à lei antipirataria promulgada recentemente em França, que permite sanções e privação da utilização da internet a pessoas que façam downloads ilegais.
Ora, para quem anda desatento, ontem José António Pinto condenou esta lei e afirmou que, num Estado de Direito como Portugal, seria inadmissível que se colocassem "vigias" nas pessoas e que lhes fosse castrado o acesso e o direito à informação (no fundo, para quem não é burro, é o que as suas afirmações significam).

É mais do que óbvio que muito rapidamente vieram logo as Marias Ofendidas [leia-se: chupistas das indústrias audiovisuais e respectivos "advogados de defesa" como o MAPiNET ou a ACAPOR (a AFP e o Tozé Brito também não hão-de tardar - vai uma aposta?) e artistas-paus-mandados, ou artistas que fazem bastante dinheiro com as vendas físicas ou com os contratos pré-estabelecedos que prevêm essas mesmas vendas, cujo panorama no estrangeiro costuma ser exactamente igual] acusar o representante da pasta da Cultura de estar meio ché-ché, de ser ignorante face à situação e tinha que vir o cliché tuguês do «Demita-se!».
O ridículo é atingido quando uma das Marias Ofendidas, a Maria MAPiNET, diz não descartar a hipótese de acusar formalmente o Ministro de incitar a prática criminosa com as suas declarações.

Há uns tempos atrás teci uma analogia que considero que volta a fazer sentido...
Em escalas e contextos completamente distintos, a postura e as afirmações dos chupis... **cough cough** representantes das indústrias audiovisuais é em tudo igual à da Igreja Católica quando confrontada com uma mudança de paradigma tão grande que põe em causa a sua existência institucional.


MUDANÇA DE PARADIGMA

Na minha opinião, esta é a expressão-chave que está na origem desta celeuma e que, determina facilmente quem tem razão e quem não tem.

Gostem os chupistas ou não, foi precisamente isto que aconteceu: uma mudança de paradigma, tão brusca e virulenta que não possível ser prevista nem controlada.

Gostem os chupistas ou não, a internet tornou-se a uma velocidade violenta o media de maior importância cultural a quase todos os níveis da vida social e ALTEROU PARA SEMPRE a forma de acesso à informação. Mais, alterou de forma profunda, formas de contacto humano. Mais ainda... a internet mudou, na civilização da aldeia global, a disposição hierárquica da forma e estruturação de pensamento (todos os que estão a ler esta artigo passaram de encadeamentos ideias na vertical - como os nossos pais e avós - para a disposição de pensamento e de manifestações do intelecto em separadores na horizontal... tal como num computador).

Que marcas é que estas manifestações culturais violentas significam?
Tendo em conta que estamos a falar de cultura (mais especificamente, da sua representação sob forma audiovisual), significa sobretudo que a democratização do acesso à informação - que é o porta-estandarte do projecto global - também mudou para sempre as formas de, não só de acesso, bem como da distribuição, de apresentação, de disposição da cultura e das formas de representação cultural... e até mesmo a forma de manifestação artística, principalmente nos campos que remetem imediatamente para o audiovisual, que é o que está em causa.

Significa ainda que, dada a violência - e virulência - da implementação deste novo paradigma nas sociedades, este processo em marcha NÃO PODE SER PARADO. Para as Marias Ofendidas que ainda não enxergaram: isto significa que não será com a promulgação de leis ofensivas e de carácter opressor e totalitário que vão conseguir pôr travão no combóio. Portanto, essas birras não vão valer de nada.

Os meus aplausos ao Ministro da Cultura não são por ele ter comparado o acesso à cultura a achar dinheiro no chão - analogia algo despropositada, já agora. Ora, o Ministro da Cultura não é parvo nenhum e já percebeu há algum tempo - bem como o que está implícito no projecto legislativo do Governo de Sócrates (por muito mau que seja, por muito que não se tenha cumprido e por muito magalhanizado e trapalhão que ficará para a História) as vantagens deste processo e de terem apanhado o combóio a tempo.

O vilão da estória não está, portanto, escondido nos "ladrões" de filmes de álbuns de forma "ilegal". O vilão é a própria indústria que está completamente viciada, minada de artimanhas que não favorecem em nada o artista (ao contrário do discurso que apregoam que mais falacioso não podia ser) e muito menos o consumidor. O vilão é a indústria que coloca um PVP ao público, às vezes superior em 400% ao "preço de fábrica", para pagar uma ninharia aos artistas, para pagar a publishers e marketeers, para pagar a distrubuidoras e às FNAC's para que estas possam pôr um eurito ou dois por cada unidade vendida e, claro, para enriquecer um pouco os cofres, sobretudo das grandes multinacionais e dos respectivos CEO's e administradores. E é precisamente o vilão que o Maestro Vitorino de Almeida, Tozé Brito, Pacman, Toy, João Gil, Luís Represas ou a Mariza estão a defender no contexto nacional. Mas tendo em conta que são artistas com carreiras consolidadas, boas relações com as respectivas editoras e que já ganham algum com royalties (ainda que em Portugal isso não seja nada, comparado com a indústria fonográfica britânica, por exemplo), não é difícil de perceber porque é que estão a vender o peixe do Diabo.

A tónica da questão, no fundo, é óbvia e a solução do problema é mais simples do que parece. E eu também já falei disso noutros "sítios".
É a indústria audiovisual que tem de decidir no meio de um dilema. Tem duas hipóteses: ou pára de espernear e aceita de uma vez por todas que o modelo que vigorava e onde podia reinar a bel-prazer acabou e mudou para sempre; ou decide continuar a choramingar e vai continuando a ser vencida por este contexto, morrendo aos poucos, como já vem acontecendo. As Marias Ofendidas parecem preferir a segunda hipótese, mas o problema é delas.
E as Marias Ofendidas respondem-me: «O problema não é só nosso, é também das pessoas que serão despedidas com o declínio da indústria».
E a mim caberá retorquir: «Se se convencerem de que esta indústria pode continuar a existir de acordo com as regras do novo paradigma, isso talvez não aconteça. Esta não será a primeira nem a última indústria/instituição a ter que sacrificar os recursos humanos por mudanças bruscas no panorama. Caso contrário, sempre podem usar o argumento da tão famigerada crise».

Compete aos representantes da indústria convencerem-se de uma vez por todas de que não estamos na década de 1920, em que têm lucros milionários à custa de gravações básicas de cantores e músicos de blues que eram então tão fáceis de explorar...

1 comentário:

poor guy fashion victim disse...

Bom ver que o menino voltou às lides.